Que ingenuidade, que pobreza de esp�rito, dizer que os animais s�o m�quinas privadas de conhecimento e sentimento, que procedem sempre da mesma maneira, que nada aprendem, nada aperfei�oam! Ser� porque falo que julgas que tenho sentimento, mem�ria, id�ias? Pois bem, calo-me. V�s-me entrar em casa aflito, procurar um papel com inquietude, abrir a escrivaninha, onde me lembra t�-lo guardado, encontr�-lo, l�-lo com alegria. Percebes que experimentei os sentimentos de afli��o e prazer, que tenho mem�ria e conhecimento.V� com os mesmos olhos esse c�o que perdeu o amo e procura-o por toda parte com ganidos dolorosos, entra em casa agitado, inquieto, desce e sobe e vai de aposento em aposento e enfim encontra no gabinete o ente amado, a quem manifesta sua alegria pela ternura dos ladridos, com saltos e car�cias.B�rbaros agarram esse c�o, que t�o prodigiosamente vence o homem em amizade, pregam-no em cima de uma mesa e dissecam-no vivo para mostrarem-te suas veias mesent�ricas. Descobres nele todos os mesmos �rg�os de sentimentos de que te gabas. Responde-me maquinista, teria a natureza entrosado nesse animal todos os �rg�os do sentimento sem objectivo algum? Ter� nervos para ser insens�vel? N�o inquines � natureza t�o impertinente contradi��o.
Voltaire